Katia Canton

Sinos.

2012

A Gravura Procura Sentidos

Seu olhar voltado para cima contempla agora as nuvens vagantes e as colinas nebulosas dos bosques. Seu eu também está ao revés nos elementos: o fogo celeste, o ar que corre, a água que berça e a terra que sustenta. Seria isso a natureza? Mas nada do que ele vê existe na natureza: o sol não se põe, o mar não tem aquela cor, as formas não são as que a luz projeta na retina. Com movimentos inaturais das articulações ele flutua entre espectros; lastros humanos em posições inaturais deslocando seu peso desfrutam não o vento mas a abstração geométrica de um ângulo entre o vento e a inclinação de um maquinismo artificial, e assim resvalam na pele lisa do mar. A natureza não existe? (Palomar, Italo Calvino).

Tal como faz o senhor Palomar, protagonista do último livro de Italo Calvino, a obra de alguns artistas contemporâneos funciona como um telescópio invertido, voltando-se, não para a amplidão do espaço, mas trazendo esse sentido de amplitude para as pequenezas do cotidiano, enxergando em cada minúcia, cada detalhe, cada objeto, a lógica do funcionamento de toda a natureza, de toda a vida.

O alfabeto visual de Cris Rocha se configura preponderantemente a partir de um desejo de liberdade; um desejo quase corporal de tatear e expandir os limites que o papel impõe ao peso da mão, dos cortes, das incisões.

A obra dessa artista se materializa justamente sobre a história do traço, as passagens da cor, as negociações com o papel, que ora resiste às investidas das experiências, ora se desgasta e se anula. Seus trabalhos são possibilidades de existência, embates entre vida e morte, mesmo que suas formas possam ter contornos reconhecíveis esboçando simples sinos ou funis.

Mergulhando nas entranhas da gravura, Cris bordou chapas metálicas com sinais de desejo de memória, encantamento com a história e um sutil e revigorante toque de subversão.

KATIA CANTON “Em busca do sentido”, 2012.