Cris Rocha
da gravura e além
Suas composições – notáveis pelo lirismo – não revelam de imediato que tudo nelas é digitalmente controlado. Em seus trabalhos sobre papel mais recentes, lida com a fragmentação/fusão de gravuras. Essa prática lhe permite criar tanto obras de caráter intimista como grandes painéis. Estamos diante de uma poética em construção.
Maria Alice Milliet
curadora






Cris Rocha
da gravura e além
Em 2000, Cris Rocha veio de Porto Alegre para São Paulo, trazendo na bagagem o que pôde salvar de seu currículo de jovem artista: entre pinturas e gravuras, vieram tiras de papel contendo longas sequências de pequenas imagens gravadas em metal semelhantes a fotogramas de um filme. Quase vinte anos depois, essas miniaturas saíram da gaveta, dando origem a uma série de trabalhos altamente sofisticados. A recuperação desse material se deu em fase de intensa experimentação em que a artista, atraída pelos novos meios de produção de imagens, passou a usar recursos digitais na constituição de suas obras.
Nos anos de formação, Cris oscilou entre gravura e pintura até que a gravação em metal se impôs como disciplina e fundamento de sua criação.
Entretanto, o gosto pelo pictórico permaneceu em sua obra gráfica e nos trabalhos mais recentes cuja fatura incorpora tecnologia digital.
Para Cris, a gravura deixou de ser produto final e se converteu em signo inaugural de um processo criativo que inclui a combinação, o tratamento e a impressão de imagens digitais. Para entender melhor como procede, basta observar o que acontece com as miniaturas: cada uma delas gera um registro digital passível de ser manipulado eletronicamente.
Como se sabe, a exploração virtual abre para uma infinidade de caminhos. Diante de tantas opções e da necessidade de fazer escolhas, os artistas, muito frequentemente, se deixam guiar pela sensibilidade poética em suas decisões. Cris não faz diferente. Suas composições – notáveis pelo lirismo – não revelam de imediato que tudo nelas é digitalmente controlado.
Em algumas séries, linhas ondulantes e manchas difusas sugerem paisagens aquáticas. Trata-se de um mundo de formas sinuosas, de reflexos e transparências, de um mundo regido pela luz. Algumas dessas imagens evocam o alvorecer à beira de um rio, quando a luz invernal deixa entrever os delicados capins que afloram na superfície d’água. Nada perturba a quietude da manhã…
A impressão que se tem é de que a artista partiu da observação da natureza. Mas não. Essa plasticidade luminosa decorre da combinação de fundos de cor obtidos por gravações em água-tinta e lavis aos quais se sobrepõem traços enérgicos gravados à ponta-seca e água-forte sobre chapas de metal. Os cortes, ampliações e fusões necessários para produção dessas imagens são operados por profissionais da informática, sob orientação da artista. O que temos não são paisagens, representações da natureza, e sim, os resultados de uma poética em construção.
Maria Alice Milliet – 2017



